A Ação Afirmativa foi criada na sequência das leis que colocaram fim à discriminação racial nos EUA, nos anos 60-70, no que se conheceu como Movimento pelos Direitos Civis.
Foi baseada no espírito altruísta de reconhecimento de culpa para com o passado escravagista e, simultaneamente, reparação para com os ex-escravos, cuja consequência era a situação social de pobres e desprotegidos.
Com isso, a interpretação das boas intenções migrou lentamente para a consolidação de privilégios.
Segundo o NYTimes, “subescrevendo a opinião da maioria, o presidente do tribunal, John Roberts, ficou do lado dos críticos da política. Ele afirmou que a ação afirmativa é racialmente discriminatória e inconstitucional. ‘Eliminar a discriminação racial significa eliminar tudo isso’, escreveu ele.”
A supressão do princípio da impessoalidade acaba sempre na legalização do favoritismo. Alguém lembrou do Zanin?
As cotas vieram deste princípio e se consolidaram com a ascensão do coitadismo na esteira populista que parece não ter fim.
A decisão da Suprema Corte americana de aboli-la, justamente numa fase em que se institui o racialismo progressivo, questiona as tentativas cada vez mais discriminatórias de buscar privilegiar os “desfavorecidos” pela inserção de mecanismos reparadores, entre eles, a mais perversa de todas as assertivas que já li na perigosa ascensão das ideias autocráticas: a fusão do ambientalismo histérico com o racismo estrutural.
Esse movimento vem ganhando proporções assustadoras, porque se baseia em duas premissas: a de que os ricos (países e pessoas) são os responsáveis pela poluição associada com a de que os descendentes de antigos escravagistas são os devedores de reparações aos descendentes de escravos.
Não faltam estatísticas para suportar estas ideias, até porque se entende que ser um país rico implica em consumir mais energia.
A fusão com o racismo estrutural é uma tentativa de mostrar que as populações em situação de risco ambiental são as mais pobres e, por isso, moralmente os endereços para onde devem ser canalizadas as verbas de reparação, notadamente para os países pobres.
Essas ideias foram geradas dentro da ONU, a organização que se sabe ser frequentada por uma maioria de países pobres, que o são exatamente por serem sempre representadas por marionetes e gatunos. Se não o fossem, não seriam pobres.
Nos EUA, já se tem a lista de cem parlamentares cujas ascendências estão vinculadas ao escravagismo. Descendentes de escravos e negros cativos na mesma legislatura já se abraçam consternados pelas descobertas do passado.
Tomando a isenção do crime pela comprovação da ascendência, o mundo vai caminhando para uma espécie de pureza ancestral semelhante a do nazismo, em que a inclusão do indivíduo nos assuntos de estado era aceita somente com a demonstração da inexistência de sangue judeu nos antepassados, prática que foi copiada da Inquisição Portuguesa na averiguação até o terceiro grau que comprovasse não haver parentesco, primeiro com os judeus e, depois, com os Cristãos Novos.
O racialismo precisa ser confrontado em nossa mentalidade pseudo-intelectual. Por exemplo, na entrevista que deu ao programa Roda Viva, ano passado, na passagem do centenário de comemoração da Semana de Arte Moderna, o convidado Ruy Castro, um carioca da gema, procurou desprezar sua importância falando que não apenas não se leem mais seus autores, como se tratou de um acontecimento sem muita importância, até porque, um de seus financiadores, Paulo Prado, era originário de uma família de escravocratas.
O convidado participou do programa por sua fama de conhecedor da cultura nacional, mas capitulou ao racialismo em preferir o linchamento moral ao dever de reconhecer a importância do autor de Retrato do Brasil para a cultura brasileira.
Isto apenas significa que a decisão da Suprema Corte americana vai repercutir na agitação das ruas, nas colunas de jornais, discursos políticos e redes sociais, onde a racionalidade da decisão será fortemente contestada, até porque a lavagem cerebral do populismo já predomina largamente.
O favoritismo é o pai do privilégio, de onde parte a corrupção moral que transforma o mérito em mera sucata intelectual.