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segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

Energia solar doméstica

Carlos U Pozzobon


A MISTIFICAÇÃO DA ENERGIA SOLAR.

Tenho acompanhado os debates sobre o uso de painéis solares e a cada dia fico mais irritado. Gente com bom nível de conhecimento se deixa enredar por argumentos estúpidos que não fazem o menor sentido para o interesse nacional, entendendo por interesse nacional o bem estar da população. Não poderia ser diferente, o grau de obscuridade que atingiu o país parece ter deixado as cabeças tão dependentes da escuridão que elas repelem qualquer raio de luz. Vamos ao caso.

O uso de painéis solares para abatimento de custos de energia elétrica durante o dia tem sido uma regra mundial em proporções gigantescas, mas o lobby da energia suja prefere esconder-se através de uma falsa problemática tributária para escorchar os contribuintes que investem para diminuir as dependências com os monopólios de distribuição a que estão sujeitos.

O argumento de que o uso de energia solar doméstico representa prejuízo para as distribuidoras não resiste ao questionamento. Se um residente gasta 200 reais por mês em energia e com placas solares sua conta passa para 100 reais, isto significa que a economia de 100 reais é a mesma que ele teria se tivesse:

1) Viajado;
2) Trocado lâmpadas de maior consumo por menor. Quem já substituiu todas as velhas lâmpadas por led fez isso;
3) Aposentasse o velho forno elétrico ao construir uma churrasqueira.
4) Fizesse um corte no excesso de lâmpadas e aparelhos acesos sem necessidade.

Se nestes casos não existe problema, ele deve se situar na outra ponta. Então vamos a ela.

Suponha que você more num local que precisa tomar uma estrada pedagiada para fazer compras, digamos, ir a um supermercado com padaria. Para diminuir as despesas com pedágio, você resolve fazer uma reordenação de seus hábitos domésticos e compra uma máquina de fazer pão, de tal sorte que em vez de ir todo o dia ao supermercado, você termine indo apenas 1 vez por semana. Por acaso a empresa que explora a rodovia teria direito a uma indenização porque você passou a gastar menos pedágio? Ela também tem os mesmos lucros cessantes de uma empresa de energia elétrica.

O que acontece com o sistema elétrico? Uma energia gerada em baixa tensão quando poupada acarreta uma diminuição da geração em alta tensão correspondente. Para a rede distribuidora, é verdade que ela passou a vender menos, mas alguém vai consumir a sua energia e ela pode até usar a nova eletricidade na rede para se acomodar a esta realidade, como por exemplo, ligando novos consumidores ou até mesmo prolongando uma rede que já estava chegando ao ponto de saturação e com isso poupando investimentos de curto prazo.

Se você fizer uma horta de produtos orgânicos (tão em moda nos dias atuais), os supermercados teriam algum direito a indenização porque você passou a consumir suas próprias hortaliças? E se você vender para seu vizinho? Os supermercados iriam pagar um lobby para dizer que você não está recolhendo tributos e se associar ao governo para acabar com sua horta?

Mas afinal quem perde?

No pedágio a concessionária da rodovia; nas hortaliças o produtor e supermercado que você dispensou. Na eletricidade, o distribuidor menos, e o gerador mais. E quem são os geradores? No Brasil, as usinas que trabalham interligadas e utilizam termelétricas para completar a carga consumida que não é gerada nas hidrelétricas e eólicas. Logo, são os proprietários de termelétricas que estão na ponta com a obrigação de reduzir a entrega de energia na rede porque a carga de consumo diminui com a inserção da eletricidade gerada pelos painéis solares.

Portanto, é o lobby das térmicas que está por trás de toda esta polêmica, utilizando para isso o encosto no governo pelo argumento tributário. Surpreende que se fale tanto em energia limpa e na hora que ela começa a se desenhar no consumo do país, o lobby da energia suja seja capaz de imperar na imprensa.

Espero que não vençam. Quando do advento da tecnologia VoIP (voz sobre o protocolo IP), no final dos anos 90, as teles começaram a sabotar todos os aplicativos que surgiam, não permitindo acesso à rede. Eu pessoalmente fui prejudicado e abandonei o setor. Com o tempo, as teles tiveram de aceitar o tráfego devido a pressão dos consumidores e de grandes empresas como Skype e WhatsApp que forçaram os órgãos regulatórios a aceitar o tráfego primeiro de mensagens, e depois de voz e vídeo. Hoje em dia, a imensa maioria de ligações de voz e vídeo são feitas por aplicativos. Os correios abandonaram o telegrama depois do fax e do e-mail, e assim sucessivamente. Deveriam ter recebido uma compensação?

Espero que a tecnologia solar, usada em grande escala em países como Espanha e China, seja amplamente utilizada pelos residentes sem as ameaças mistificatórias do lobby de energia suja. O desconto que as distribuidoras estão pleiteando não vai gerar receita para o governo. Simplesmente, o quilowatt entregue na rede pelos residentes vai ser reduzido quantitativamente, e as distribuidoras vão vender integralmente e embolsar a diferença sob o pretexto de manutenção de rede.